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As Cinzas da Vida

Atualizado: 24 de jan. de 2023



Um dos mandamentos mais enigmáticos e difíceis de compreender é o da פרה אדמה Parah Adumah (novilha vermelha), tratado no capítulo 19 de Bamidbar (No Deserto), conhecido por Números.


Resumidamente, uma novilha (vaca que ainda não deu cria), de pêlos totalmente vermelhos, deveria ser levada para fora do acampamento das tribos, morta diante do sacerdote e queimada por completo. Suas cinzas, misturadas em um pouco de água fresca, serviriam para purificar os filhos de Israel do pecado da impureza, causado pela morte. Aqueles que entravam em contato com a morte – seja tocando um cadáver ou adentrando a mesma tenda de um falecido – estariam impuros ritualmente por 7 dias, e deveriam ser submetidos à purificação pelas cinzas da Parah Adumah no 3º e 7º dias; caso contrário, seriam eliminados da comunidade, pois teriam maculado o santuário de YHWH (Nm 19:20).


Nesse momento em que o Mishkan (Tabernáculo) era o centro de vida de Israel, o fato de estar impuro ritualmente impedia as pessoas comuns de levar ofertas ao מזבח misbeach (altar), e os sacerdotes de exercerem suas funções. Além desse nível prático e literal do mandamento, deve-se lembrar também que o próprio ser humano deve ser como um מקדש mikdash – um lugar de santidade – para habitação do Altíssimo, uma vez que o משכן Mishan (Tabernáculo) foi erguido para que Sua Presença habitasse no meio/entre/no coração do povo (Ex 25:8).


Assim, manter-se em estado de impureza, intencionalmente, profanando seu próprio corpo/Mishkan ou o corpo da comunidade, era uma atitude que deveria ser punida com o afastamento desse membro.


As sérias medidas restritivas dessa lei estão relacionadas ao que a morte representa: o mais alto nível de impureza que existe. A morte é a oposição completa ao Criador e à toda a Sua obra, que é a vida, vida perene. Assim, ao entrar em contato com a morte, não seria possível estar “vestido adequadamente” para aproximar-se e interagir com a Fonte de Vida. Era preciso purificar-se antes.


A dimensão do hebraico

Ao analisar as palavras no hebraico, enxergaremos algo fascinante que nos ajudará a compreender a perspectiva espiritual dessa mitsvah (mandamento). A expressão פרה אדמה “novilha vermelha” pode ser lida, em nível Remez (alusivo, figurativo) de maneira totalmente diferente. A palavra פרה (parah), novilha/vaca, também é o verbo que significa frutificar, escrito da mesma maneira e com idêntica pronúncia.


A palavra אדמה (adumah), vermelha, também significa terra (adamah), uma terra cultivável. Esta palavra liga-se diretamente a אדם (adam) ser humano, aquele que é justamente formado do pó da terra.


De fato, o ser humano e a terra estão intimamente conectados; uma vez que a terra é amaldiçoada pelos atos do homem. E este, da mesma forma, sofre as consequências disso (Gn 3:17-18).

Dessa maneira, as palavras פרה (parah) e אדמה (adumah) trazem os conceitos de “frutificar” e “terra, vermelha, ser humano”. O paralelo com o ritual da Parah Adumah (novilha vermelha), torna-se, então, claro.


O ser humano, quando tocou a morte (nível físico e espiritual) foi contaminado pela sua impureza e impedido, assim, de aproximar-se ou tocar naquilo que é santo/separado. De certa maneira, é um período infrutífero, pois ele não está de forma plena na Presença do Altíssimo. Assim, as cinzas da Parah Adumah tornam novamente o ser humano uma terra fértil, pronto para aproximar-se da Fonte de toda a Pureza e Santidade, e gerar frutos para o Reino.



A natureza fala

Encontramos um belo exemplo dessa mesma alegoria na natureza. Os vulcões, tidos por destruidores, na verdade, são gigantes renovadores da vida, do solo que está ao seu redor. Quando entram em erupção, além da lava, expelem grandes quantidades de cinzas, que estão repletas de elementos importantes para a terra, como: sílica, oxigênio, dióxidos de enxofre e carbono, entre outros. A lava, por sua vez, carrega diversos fragmentos de rochas, como o basalto e o feldspato, que possuem em sua composição minerais como o potássio, o magnésio e o ferro, que são fundamentais para a ativação da fertilidade do solo.


Assim, todo esse material expelido – lava e cinza – se misturam, sendo derramados pelas encostas e ao redor do vulcão, formando um ambiente repleto de nutrientes, transformando o solo em uma terra riquíssima e extremamente fértil. Na verdade, os solos vulcânicos são considerados os mais férteis que existem! Por essa razão, ao longo da história, muitas comunidades se estabeleceram próximas aos vulcões, aproveitando a grande riqueza de recursos que esses gigantes proporcionam, apesar dos riscos.



Vemos, portanto, que a própria natureza revela um paralelo magnífico desse mandamento:

• Uma novilha vermelha que deveria ser queimada até às cinzas.

Rochas derretidas pelas extremas temperaturas formam o magma, substância vermelho ardente. Na erupção, ele é lançado aos ares junto com as cinzas dessa queima.


• Misturada à água fresca, as cinzas da novilha eram aspergidas sobre a pele daquele que estava impuro, contaminado pela morte, “infrutífero”, trazendo sua purificação, renovação.

Em contato com a superfície – a pele da terra (adamah) –, as cinzas vulcânicas promovem a revitalização do solo, tornando-o fértil, produtivo. Em verdade, o mais fértil que existe.


Assim, adam e adamah – homem e terra – são purificados, trazidos novamente à vida, ressuscitados da morte. No 3º e 7º dias, o impuro seria aspergido. Uma alusão à ressurreição do Messias após o terceiro dia e à renovação da terra, ao 7º dia, sob seu reinado (7º Milênio).


E as cinzas – símbolo de dor e luto (2Sm 13:19, Es 4:1,3; Jó 2:8, 42:6, Sl 102:9, Is 58:5, Is 61:3, Jr 6:26, etc) – ganham uma nova perspectiva com a Parah Adumah: da impureza para a pureza, da distância para a aproximação, da morte para a vida!


 

Conheça também outros incríveis paralelos entre as cinzas da Parah Adumah e a pele humana. Acesse aqui a parte 2 do estudo.

 

Vídeos com conteúdo relacionado:


1. ADAM, ser humano. A terra que têm fôlego.


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claudia helena cezario ferreira
claudia helena cezario ferreira
Sep 06, 2023

A simplicidade de explicar algo tão complexo me faz entender textos bíblicos que outrora não entendia. Obrigada!

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