Ao anoitecer desta última sexta-feira, 15 de março/2022, coincidentemente também a virada para o dia 15 de Nissan (de 5782), iniciou-se os dias de מצות Matzot, os pães sem fermento.
A festa compreende 7 dias, começando com o Seder (organização) de Pessach. Após algumas leituras e bênçãos, é feita uma refeição que inclui ervas amargas e também matzot (Ex 12:8). Essa celebração é um memorial pelo dia em que YHWH tirou o povo do Egito. (Ex 12:17-19).
Antes do pôr-do-sol, cada família imolou um cordeiro, passou seu sangue na verga e umbrais da porta e assou sua carne. Comeram apressadamente, vestidos, calçados e aparatados, prontos para viajar. (Ex 12:3-11). À meia-noite, Adonai retirou a vida de todos os primogênitos na terra do Egito (humanos e animais), porém passou sobre (פסח passach) a casa daqueles que tinham o sangue do cordeiro como sinal (Ex 11:4-5, Ex 12:12-13).
Mais de mil anos depois, no mesmo dia ordenado para a Pessach (14 de Nissan), Yeshua dá sua vida pela humanidade, possibilitando que todos que nele crêem possam também ter o sangue do Cordeiro de Deus sobre suas vidas, para remissão de pecados.
Pessach פסח e Matzot מצות são celebrações intimamente conectadas, não apenas no aspecto temporal – uma vez que o jantar de Pessach acontece já no 1º dia de Matzot – mas, principalmente, no seu significado espiritual.
Em Pessach, recebemos o sangue do Cordeiro, que cobre os umbrais de nossa própria casa carnal. E, tão logo isso aconteça (ou seja, tão logo reconheçamos a vida de Yeshua derramada sobre nossas próprias vidas), faz-se necessário abandonar o pecado, seguindo uma vida de retidão, arrependimento e amor. De fato, um novo caráter, um novo nascimento. E é em Matzot que encontramos todos esses significados.
O pecado é comparado ao processo de fermentação. Assim como ele desfigura o homem da sua própria origem – um ser feito à imagem e semelhança do Altíssimo –, também o fermento desfigura a massa, fazendo-a inchar, inflando-a com ar, espaço vazio. Assim, nos 7 dias de Matzot também devemos eliminar todo o fermento, deixando de ingerir grãos que fermentam a massa. Esse aspecto físico da celebração reflete, naturalmente, algo muito maior: eliminar de vez o pecado/fermento em nossas vidas, uma vez que os 7 dias são a representação de um ciclo completo, a plenitude de nossos dias.
O QUE É DE FATO A MATZAH?
No aspecto natural, Matzah é um pão muito simples, feito apenas com água e farinha, todo perfurado (a fim de que saia o ar da massa), e que assou sem que ocorresse fermentação natural. Porém, nesse pão tão pobre, ressequido, bruto e sem muitos atrativos podemos enxergar coisas grandiosas!
Matzah é chamado na Torah de “lechem ani” לחם עני, uma expressão de duplo significado, uma vez que עני “ani” representa tanto o pobre como o aflito. “Foi às pressas que deixaste a terra do Egito” (Dt 16:3), por isso, um pão que foi feito em aflição, sem tempo para que a massa crescesse. Além disso, sua receita pobre (apenas água e farinha) também refletia a condição de escravidão do povo, falta de recursos e de tempo para produzir um alimento melhor elaborado. Todos os aspectos físicos da Matzah refletem a realidade vivida pelas almas que habitavam no Egito.
UM PÃO ESMAGADO, PERFURADO E “COM HEMATOMAS”
Parece assustador descrever um pão com essas características, mas é exatamente assim que é a Matzah!
A sua massa deve ser feita apressadamente para ser colocada no forno antes que comece a levedar, ou seja, dentro de uma janela de apenas 18 minutos. Isso faz com que seja preciso amassá-la vigorosamente, com rapidez e sem delicadeza. Não há qualquer descanso para a Matzah.
Quando a mistura de água e farinha já estiver homogênea, o pão deve ser cortado em pedaços sobre os quais será passado o rolo de massa, com bastante energia, para deixá-la o mais fina possível, quase que transparente.
Aqui vale um adendo das pérolas do hebraico! Com as mesmas letras de מצה matzah, também é formada a palavra צמה tsamah, que significa justamente “véu”, ou seja, como deve ser a massa desse pão!
Após já estarem nessa condição, a massa é totalmente perfurada. Isso permite que saia o vapor ao assá-la, evitando, assim, qualquer inchaço e fermentação. Até o século 20, não havia maquinário industrial para produção de Matzot. Assim, ou eram feitas em casa (e perfuradas com um garfo) ou em escala, utilizando-se de instrumentos próprios para o corte e perfuração. Abaixo, um exemplo que pertence ao Jewish Museum (Museu Judaico) de Nova York, e mais parece um instrumento de tortura! Na verdade, não por acaso…
E, por fim, a massa é levada ao forno, que deve estar em temperatura máxima. Por ser muito fina e levada a um calor de quase 300º, as bordas e irregularidades tendem a ficar mais queimadas, o resultado não é uniforme como em outros pães. Essas imperfeições são como que machucados, “hematomas” na massa, partes mais escuras que as demais.
De fato, podemos ver que não sem sentido, a Matzah é chamada de pão da aflição. Porém, apesar disso, a Matzah também foi elevada como o alimento que representa a libertação. E, não apenas a salvação física, mas a do pecado, do medo e da escravidão. Sendo assim, é nítida também a ligação que há entre a Matzah e Yeshua, o enviado de YHWH, por meio de quem somos resgatados de todas essas coisas.
Na verdade, a própria descrição do Mashiach, ao dar sua vida, revela todos as características da Matzah!
Yeshayahu (Isaías) 53:4-5
"Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por ferido de Elohim, e oprimido ומענה (umeuneh). Mas ele foi ferido מחלל (mecholal) por causa das nossas transgressões, e esmagado מדכא (meduka) por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras חברת (chaburot) fomos sarados."
Analisando todas as palavras-chave desse texto, encontramos:
Meuneh מענה: “oprimido, aflito” - adjetivo relacionado à palavra (עני ani), aquela que define Matzot (Matzot lechem ani - מצות לחם עני)
Mecholal מחלל: proveniente do verbo חָלַל (chalal), que significa literalmente furar. Outras definições que se somam a esse termo são: ferir, profanar, manchar, quebrar, humilhar.
Meduka מדכא: proveniente do verbo דָּכָא (daka): quebrar em pedaços, bater até quebrar, machucar, destruir, oprimir, humilhar
Chaburot חברת: machucados, feridas, hematomas, listras, lacerações
Assim como a Matzah, Yeshua sofreu em seu próprio corpo e alma toda a aflição que carrega esse pão. Foi oprimido, quebrado, humilhado perante os olhos de muitos. Ferido e dilacerado por chicotadas. Perfurado em suas mãos e pés por pregos gigantescos, e em sua cabeça por espinhos terríveis. Seu corpo foi destruído, profanado, feito em maldição ao ser pendurado no madeiro (Dt 21:23). E, ainda assim, sem pecado, sem fermento, puro como a Matzah.
O pão do pobre, o pão do aflito é a representação fidedigna do Pão que desceu dos céus. Aquele sem pecado, mas que suportou em sua própria massa o chametz do mundo. Pouco antes de sua morte, compartilhou com seus discípulos do seu corpo e sangue: Matzah e vinho; fazendo deles elementos em memória de sua morte e da nova aliança, respectivamente.
“Por isso, celebremos Pessach não com chametz (fermento) velho, nem com o chametz da malícia e da corrupção, mas com as Matzot da sinceridade e da verdade.” (1Co 5:8)
Chag Sameach! Feliz celebração!
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Glórias a Deus.
Fico deslumbrado com essas informações tão preciosas professora Paula.
Shalom.