Por que o primeiro milagre de Yeshua foi algo que, à primeira vista, parece menos importante do que a cura de uma pessoa, por exemplo? Ou talvez a multiplicação do alimento para aqueles que tinham fome? Conhecer o significado do vinho e das bodas de casamento nas Escrituras e cultura judaicas ajudam a compreender esse milagre, porém há paralelos muito maiores e mais profundos no que Yeshua fez. E esses paralelos estão inclusive alinhados dentro de um mesmo aspecto: as primeiras e as últimas coisas. Não por acaso, algo que também nos fala diretamente sobre o próprio Messias! Vamos analisar ponto a ponto.
O Material do Recipiente
Ao contrário do que seria natural – usar os próprios jarros que serviam o vinho – Yeshua fará o milagre utilizando 6 vasos de pedra, que continham água para purificação ritual.
Os jarros de vinho para mesa, fabricados em cerâmica, estão intimamente relacionados à natureza humana, ao corpo físico, uma vez que ambos são formados do pó da terra. Já a pedra é um material pronto, criado pelo próprio Deus, sem qualquer envolvimento humano. Assim, podem ser vistos como um material mais elevado para servir de recipiente para a água de purificação (netilat yadaim – lavagem cerimonial de mãos; e eventualmente de utensílios | Mc 7:3-4, Mt 15:2).
Nesse aspecto, o hebraico também revela algo interessante: o termo pedra, material dos vasos do milagre, é אֶבֶן (éven). Essa palavra é derivada do verbo בָּנָה banah, que significa construir, já que a pedra é o elemento principal para uma construção sólida. Além disso, dentro de éven, encontram-se duas outras palavras: אב (av) pai e בן (ben) filho. Conectando as pontas, vemos uma relação perfeita (para o ser humano), já vez que o filho é uma “obra” de seu pai!
Em vez de usar vasos de cerâmica, que estão conectados à natureza e obra humanas, Yeshua transforma água em vinho dentro de vasos de pedra (כַדֵּי־ אֶבֶן, kadei-éven), revelando a natureza celestial desse milagre, e a solidez na unidade entre o Filho e o Pai Celestial.
O Vinho
Elemento de destaque nas Escrituras, sua simbologia é extensa e alcança vários níveis. A bebida das celebrações, aquela que alegra o coração (Sl 104:15, Pv 3:9-10), cuja árvore e frutos são uma das sete espécies (bênçãos alimentares) da terra prometida (Dt 8:8). O vinho também servia como oferta de libação (Lv 23:13, Nm 15:5,10), tinha uso medicinal (Pv 31:6-7, 1Tm 5:23) e, acima de tudo, foi o símbolo usado por Yeshua para selar a renovação da Aliança (Mt 26:27-29), assim como Mosheh havia feito com a Torah (Ex 24:6-8, Dt 29:14-15).
Na sua última refeição com os discípulos, Yeshua levanta a taça de vinho anunciando a Nova Aliança por meio de seu sangue, o qual seria muito em breve derramado.
O milagre do vinho aponta para o futuro do Messias, o cumprimento de sua missão redentiva. A água nos vasos de pedra que seria usada para purificar ritualmente/“superficialmente”, foi transformada no melhor dos vinhos (Jo 2:10) – representação do sangue do Messias –, aquele que verdadeiramente purifica dos pecados (Hb 9:13-14).
O vinho e a água, são elementos relacionados principalmente ao aspecto FINAL (término e finalidade da missão do Ungido). Além da simbologia do vinho como sangue da Aliança, derramado na cruz, Yeshua também foi ferido em seu lado, vertendo desse mesmo lugar sangue e água. (Jo 19:34)
Porém também encontramos um paralelo desses elementos naquilo que foi INICIAL. No processo de libertação dos hebreus do Egito, a PRIMEIRA praga foi trazida por Mosheh, ao transformar as águas do Nilo em sangue. A Torah diz que até mesmo a água contida em vasos de madeira e de PEDRA foi transformada em sangue (Ex 7:19). Apesar de os milagres terem funções opostas (Mosheh: julgamento / Yeshua: bondade), água e sangue (representado pelo vinho) estão juntos aqui no aspecto do PRIMEIRO (Mosheh: milagre da primeira praga / Yeshua: primeiro milagre de todos).
A Natureza do Milagre
Água e vinho são compostos de natureza completamente diferente. A água é um elemento mineral (inorgânico) e o vinho é um líquido orgânico, gerado a partir da maturação e fermentação das uvas. Um processo biológico que leva tempo. E, nesse caso, quanto mais tempo, melhor será o vinho (Lc 5:39). O que Yeshua fez, então, não foi apenas transformar um elemento mineral em algo “vivo”, orgânico, mas criar tempo! O tempo que se desenrola desde o plantio, amadurecimento e colheita das uvas, além de preparo e fermentação da própria bebida até que atinja as condições perfeitas para ser servida como vinho.
E quando Yeshua cria tempo, ele faz referência à primeira palavra de toda a Escritura: בְּרֵאשִׁ֖ית (bereshit) no princípio. Antes que pudesse existir qualquer criação, foi necessária a criação do TEMPO (e do espaço) a fim de que as coisas pudessem se manifestar. Uma vez que tudo se inicia “no princípio”, é necessário admitir que foi criada uma dimensão temporal para que houvesse esse ponto de partida.
Muitos estudos que tratam do tema aqui em pauta, associam os 6 vasos de vinho com os 6 dias da criação. De fato, esse é o paralelo mais visível. Porém, a análise do hebraico vai permitir ir muito além disso, aprofundando o significado do milagre de Yeshua.
Começamos observando בראשית (bereshit). Dentro dela, encontram-se duas outras palavras: ברא (barah), significando criou (hebraico) e שית (shit), “seis” (em aramaico).
[Obs.: A interpretação judaica considera e permite a análise de termos em aramaico também, uma vez que em todas as partes do Tanach (Torah, Profetas e Escritos) há presença de palavras nesse idioma, irmão do hebraico. Apesar disso, o termo שית (shit) também existe no hebraico, sendo que um de seus significados (“fundação”) dá ainda mais valor à toda análise que se segue.]
É fácil ver, então, que o próprio termo Bereshit aponta para a criação em 6 (dias): ברא barah/criou + שית shit/seis.
No entanto, trocando de posição as letras ברא, encontramos outra palavra reveladora: בְּאֵר (beer) poço. Assim, o termo בראשית (bereshit) também revela outro conceito: seis שית (shit) + באר (beer) poço(s). O início de todas as coisas, a palavra primordial alude a 6 poços.
E o que são 6 poços senão 6 enormes vasos de pedra contendo água?!
O PRIMEIRO milagre de Yeshua – onde ele CRIOU vinho da água – se conecta ao INÍCIO da criação de YHWH, tanto na natureza do milagre, quanto no “sod” (segredo) que se revela na PRIMEIRA palavra da Torah.
É interessante ainda notar que as três primeiras letras de bereshit (ברא) se repetem na sequência da frase, como uma outra palavra, ampliando a leitura anterior. Veja:
•aבראשית | Leitura original/literal (nível Pshat): No início
•a ברא + שית | Leitura alusiva (nível Remez): Bereshit = criou + seis / Conceito: criou em 6 (dias) •aבראשית ברא | Leitura original (nível Pshat): No início criou •a(באר) ברא + שית) + ברא) | Leitura alusiva (nível Remez): Criou + seis + poço(s) / Conceito: criou em 6 (dias) (6) poço(s)
Por associação, notamos que o(s) poço(s) estão diretamente relacionados ao tempo. Ou seja, foram criadas “seis grandes medidas de tempo”. Cada um desses seis poços (ou gigantes vasos de pedra) representam um dia da Criação, uma etapa dos 6.000 anos dados para a humanidade antes que venha o Milênio.
Dessa forma, compreendemos que a relação entre a quantidade de vasos e dias da criação pode ser vista muito além de apenas um número que as conecta. Yeshua de fato “recriou”, simbolicamente, os 6 dias da criação nos vasos de pedra!
Medida Completa
Um fato que pode parecer despretensioso ou escapar à análise é o seguinte. Após Yeshua ter dito para que enchessem os vasos com água, está escrito: “E os encheram até à borda.” (Jo 2:7). O que significa realmente isso? Indo além da compreensão literal, vemos que Yeshua solicitou a medida cheia, exata, de cada vaso. Na verdade, a medida exata de TEMPO!
Cada vaso é uma representação de UM DIA da Criação, de uma ETAPA DE TEMPO. Podemos associar cada vaso a um período de mil anos (não necessariamente de maneira literal).
A tradição judaica aponta que este mundo (olam hazeh) tem 6.000 para existir. Essa é a MEDIDA que foi dada ao ser humano. Podemos compreender isso de maneira mais clara sabendo que o número 6 é quantidade de dias dada ao homem para que ele trabalhe, produza. Assim, o 6 representa a COMPLETUDE de tudo o que se refere ao mundo MATERIAL.
Isso é facilmente visto na própria geometria do número 6 também. O cubo, um quadrado tridimensional, possui 6 lados. Todos eles iguais, de mesma medida. Exatamente como são as dimensões do mundo MATERIAL em que vivemos: norte, sul, leste, oeste, acima, abaixo. Essas são as 6 dimensões espaciais em que nos movemos.
Quando os vasos são enchidos até a boca, todas as suas 6 DIMENSÕES são preenchidas, como um cubo (largura, altura, profundidade). Assim, é necessário que a medida dos 6.000 anos deste mundo (água) se complete por inteiro. Cumprido esse período, então virá o vinho novo, o vinho do casamento, a celebração, a alegria completa junto a Yeshua! Virá o momento em que ele novamente tomará do fruto da vide junto com sua noiva (Mt 26:29).
O Casamento
Não pode passar desapercebida a SITUAÇÃO em que ocorre esse milagre: uma festa de casamento.
O momento máximo de alegria para o noivo e a noiva que, finalmente, se reencontram após um período de separação e preparação, a fim de morarem juntos e constituir uma família. É assim o procedimento do antigo casamento judaico. Uma figura belíssima que, em cada detalhe, retrata paralelos na Escritura em relação à vinda do Noivo.
Anteriormente, foi dito que este milagre de Yeshua está relacionado tanto com as PRIMEIRAS quanto com as ÚLTIMAS coisas. E o casamento, certamente, revela esses dois aspectos. Após preenchidas as talhas em 6.000 anos, o Noivo retorna para buscar sua noiva e celebrar sua união por completo! É o TÉRMINO da etapa da promessa e espera e o INÍCIO de uma nova vida.
Os Vasos, o Poço e a União
Conhecendo agora a relação entre os vasos de pedra e os poços, a partir de Bereshit, adentramos novamente no hebraico para buscar outras pérolas.
Começamos por procurar tais palavras na fonte, a Torah. Uma vez que é necessário retirar a água do poço com um recipiente, um vaso, ou algo semelhante, não é surpresa encontrar tais palavras juntas no mesmo texto. Porém a SITUAÇÃO em que elas ocorrem, é surpreendente!
ותמהר ותער כדה אל־השקת ותרץ עוד אל־הבאר לשאב ותשאב לכל־גמליו
“Apressou-se em esvaziar todo o seu כדה VASO (cântaro) no bebedouro dos animais e correu ao POÇO הבאר para tirar mais água e tirou-a para todos os camelos.”
Em Gn 24:20 está o verso onde ambas as palavras ocorrem juntas, apesar de constarem outras vezes dentro da mesma história. Rivka (Rebeca) foi a jovem que retirou centenas de litros de água (!) do poço para dar de beber ao servo de Avraham (Eliezer), bem como a todos os seus 10 camelos. Um único camelo pode beber mais de 100 litros de água por vez, assim, incrivelmente, Rivka retirou cerca de 1.000 litros (ou mais) de água do poço. Um feito absolutamente extraordinário, considerando tudo o que esse trabalho envolvia.
Em Jo 2:6 é dito que os vasos que continham água perfaziam cerca de “2 ou 3 batim” (שְׁתַּיִם אוֹ־ שָׁלשׁ בַּתִּים), ou seja algo entre 74 e 111 litros, considerando 1 bat = 37 litros (Britannica Encyclopedia e Orthodox Jewish Bible). Ou seja, havia cerca de 100 litros de vinho para o casamento, uma quantidade também extraordinária! E, ainda mais, esses 100 litros são o décimo equivalente aos cerca de 1.000 litros de água retirados do poço por Rivka.
Porém, esse não é o paralelo mais significativo. A SITUAÇÃO, a MOTIVAÇÃO desse episódio surpreendem. Pois, pelo fato de Rivka ter sido tão generosa e prestativa, foi cumprido fielmente o sinal que Eliezer havia pedido para YHWH (Gn 24:12-14). Estava claro, então, que ela havia sido a ESPOSA que Adonai escolhera para Yitzchak (Isaque).
Assim, VASO, POÇO e CASAMENTO se unem novamente, num lindo entrelaçamento de histórias e simbolismos!
Os Seis Vasos do Tempo
E, por fim, a matemática divina nos faz enxergar, pela lente dos números, a exatidão de tudo o que foi analisado anteriormente.
A expressão “seis vasos de pedra” שִׁשָּׁה כַדֵּי־ אֶבֶן tem valor 692. De forma impressionante, esse mesmo valor é encontrado em certa expressão por SEIS vezes no PRIMEIRO capítulo de Bereshit (Gênesis), aquele que trata exclusivamente da CRIAÇÃO.
O paralelo se faz com: ויהי ערב ויהי בקר יום, que consta em Gn 1, versos 5, 8, 13, 19, 23, 31. E seu significado é: “e houve tarde e manhã, dia”.
Assim, a guematria fala que “SEIS VASOS DE PEDRA” são, de fato, equivalentes a UMA MEDIDA DE TEMPO!
ששה כדי־אבן = 692 = ויהי ערב ויהי בקר יום
Veja: tarde ערב (érev) e manhã בקר (boker) perfazem יום (iom), dia; uma medida de tempo. Individualmente, a frase acima, retrata UMA medida, (um) DIA (tarde + manhã). Porém, por SEIS vezes essa mesma expressão aparece no relato da Criação, somando ao todo, 6 TEMPOS, 6 DIAS, 6 VASOS.
Em todos esses detalhes, simbolismos, conexão de palavras e acontecimentos, enxergamos a grandeza do primeiro milagre de Yeshua. Um milagre é sempre grande e magnífico por si só, uma vez que ele é justamente um ponto de conexão entre céu e terra, entre o espiritual e o físico. Na verdade, o milagre é uma quebra temporária do tempo-espaço onde vivemos pela interferência divina, onde as leis naturais deixam de existir e algo novo é criado.
Fantástico professora Paula.
A cada leitura que faço percebo a infinitude da grandeza de YHWH, do zelo Dele para conosco. Vejo que tenho muito a aprender. Obrigada, A Beleza da Palavra, YHWH continue os abençoando!